Por Rodrigo Augusto Prando
O Presidente Jair Bolsonaro tem, desde o início de seu mandato, um estilo que, resumidamente, pode ser chamado de presidencialismo de confrontação. Na campanha eleitoral e nos primórdios do governo, havia dois alicerces que pareciam sustentar seu projeto para o país: liberalismo (com Paulo Guedes) e combate à corrupção (com Sérgio Moro). Tais colunas estruturais ruíram faz tempo. Sobrou, então, o gosto pelo confronto, pelo ataque aos atores políticos, às instituições e à própria democracia.
A harmonia entre os Poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário), bem como a capacidade dos poderes de exercerem freios e contrapesos aos outros poderes nunca foram tão testados como nos tempos bolsonaristas. Bolsonaro e parte dos fiéis que lhe dão apoio, nunca recuam. O presidente, assim, foi sempre dobrando a aposta e, nos últimos tempos, com sua aprovação combalida pelo resultado do combate à pandemia, pelos indícios de corrupção investigados pela CPI e, principalmente, pela real possibilidade de não se reeleger em 2022, vem atacando as urnas eletrônicas e o processo eleitoral brasileiro. Segundo sua concepção, as urnas devem ter o voto impresso e auditável, já que são portas abertas às manipulações e fraudes. Em uma de suas lives, inclusive, prometeu apresentar as provas das aludidas fraudes e, contudo, nada de concreto e relevante foi mostrado, apenas mais do mesmo, suposições já, anteriormente, desmentidas pelas agências de checagem e pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). A referida live foi considerada um equívoco e, por isso, havia a crença de que Bolsonaro interrompesse os ataques infundados à segurança das urnas e à realização das eleições em 2022. Nada disso. No final de semana após live Bolsonaro voltou à carga com suas armas retóricas.
As instituições que ao longo do tempo só absorveram os ataques, iniciaram – dentro da legalidade – as reações. Desta forma, nesta segunda-feira (2/8), o TSE abriu inquérito administrativo contra o presidente pelas reiteradas ameaças à realização das eleições em 2022 e, ainda, solicitou ao Supremo Tribunal Federal (STF) a inclusão de Bolsonaro no inquérito das fake news que lá transita. Cabe rememorar que o presidente já é investigado no STF por suposta interferência política na Polícia Federal (que levou à saída de Moro do governo) e a suspeitas de prevaricação no caso de corrupção na compra de vacinas no bojo da pandemia. Se, no Poder Judiciário, a situação de Bolsonaro complica-se cada vez mais, o mesmo, por enquanto, não se dá no Legislativo. Na Câmara dos Deputados, com Arthur Lira na presidência da casa, o presidente Bolsonaro goza de relativa tranquilidade. Lira, por exemplo, inúmeras vezes já verbalizou não ter a disposição de iniciar um processo de impeachment. Além disso, Bolsonaro e os bolsonaristas espancam a lógica ao, no discurso, atacar impiedosamente o Centrão, mas na prática, permanece de braços dados com o grupo no núcleo do poder e com a presença de Ciro Nogueira na Casa Civil. Os tempos e a lógica da política e da Justiça são distintos e ambos vão tateando para colocar limites às falas e ações de Bolsonaro. Não é fácil. Jamais houve um presidente que, no seu DNA político, traz o exacerbado gosto pelo confronto e pela ruptura institucional.
Veremos, doravante, como os atores – indivíduos, grupos e instituições – atuarão até 2022. Bolsonaro se sente confortável em ameaçar, pois parece encontrar respaldo em parte das Forças Armadas. O STF, políticos e sociedade civil não estão confortáveis com as ameaças.
O AUTOR
Rodrigo Augusto Prando é professor e pesquisador da Universidade Presbiteriana Mackenzie. Graduado em Ciências Sociais, Mestre e Doutor em Sociologia, pela Unesp.